segunda-feira, 30 de junho de 2014

Imprensa internacional registra contrastes durante o período da Copa em Manaus

Enquanto a população se voltava para as emoções dos jogos da Copa do Mundo que ocorreram em Manaus, a imprensa internacional buscava retratar outro lado da história: o gasto público milionário com a construção de um estádio de futebol e dois centros de treinamentos (CT) para apenas quatro partidas do mundial e as mazelas ainda existentes na cidade escolhida como uma das sub-sede da Copa de 2014.

Impressionados com a grandiosidade do estádio 'Arena da Amazônia' e com o valor aplicado em mais de 750 milhões na obra e 36 milhões nos dois CTs, os jornalistas estrangeiros questionavam o porquê de tanto gasto em futebol enquanto a cidade ainda vive diversos problemas desde a escolha da cidade em 2009,  até o início da competição.  Com a cooperação  do IACi, a imprensa internacional visitou os mais insalubres locais e pode perceber de perto a aflição dos moradores que habitam esses inóspitos lugares e entender o pecado capital praticado pelo governo ao aceitar o torneio da FIFA em detrimento às necessidades reais do povo.

A TV canadense CBC News fez um paralelo entre a construção do novo estádio e os problemas sofridos pelos habitantes da capital e do interior do Amazonas. Os gastos com estádios para apenas quatro partidas foram o horizonte da reportagem, uma vez que a cidade não possui clubes na divisão especial do futebol e a tradição do esporte local  anda em decadência. Observando a opulência do estádio Arena da Amazônia, a equipe da TV canadense nos deixa uma pergunta: Quem irá pagar por isso? A resposta vem com muita certeza de que todos nós pagaremos por essa inútil despesa que se transformará em elefante branco após os jogos da Copa em Manaus.

Equipe da TV canadense CBC News próxima ao novo estádio


A falta de saneamento e um grande número de pessoas morando sobre os leitos dos igarapés de Manaus foram outros fatos negativos registrados pela imprensa internacional. Em visita a bacia do bairro Educandos, onde a população convive há mais de dez anos com a promessa do governo em  sair do local, jornalistas da rádio pública nacional dos Estados Unidos NPR enfrentaram os desafios de caminhar sobre precárias pontes de madeiras, exalarem o odor fétido das águas paradas e ouvirem depoimentos sofridos de gente que mora precariamente há décadas na mesma situação. Morar em casebres invadidas pela água dos esgotos e da enchente, além de dividir o espaço com ratos, cobras, jacarés e insetos e enfrentar as mais possibilidades de contrair doenças foram outras nocividades presenciados pelos repórteres.   Apesar de todos os problemas, os moradores ainda nutrem a alegria com a seleção brasileira ao decorarem o espaço nas cores verde e amarela sobre as águas poluídas.




Correspondentes da rádio theca Radiozurnal Cesky Rozhlas 1 também se surpreenderam como os gastos astronômicos para apenas quatro partidas numa cidade onde não há tradição do futebol. Além conhecerem que os piores problemas da cidade são saneamento e falta de moradia, também perceberam que o a mobilidade urbana deixa a desejar diante de uma cidade de clima quente e trânsito confuso. As visitas aos locais sem saneamento comprovaram que tantos gastos deveriam ser melhor aplicados pelo governo. 

Jornalistas da rádio theca Radiozurnal Cesky Rozhlas 1 no Distrito Industrial 

No bairro de São Jorge não foi diferente. A dois quilômetros do novo estádio, a mesma situação foi encontrada no igarapé Cachoeira Grande, onde centenas de famílias sobrevivem desumanamente ás margens do afluente do igarapé do Mindu. A equipe da TV chinesa CCTV America viu de perto o que representa gastar desnecessariamente milhões na construção de um estádio para clubes locais fora do cenário nacional, enquanto famílias passam as piores dificuldades. Cobras sucuris rondando as casas em busca de alimentos, jacarés dando botes em crianças e cachorros e a morte de duas crianças que caíram nas águas poluídas foram algumas das histórias contada pelos os residentes do lugar.

Um pouco adentro a equipe também pode registrar as ruínas do prédio histórico da antiga represa do igarapé Cachoeira Grande, construído em 1884. Chamado atenção pela imprensa local poe seu estado de abandono, as ruínas do prédio, chamado de castelinho pelos moradores seguem na incerteza de sua restauração. Horas antes de presenciarem todas essas desordens, a equipe se deparou com um grupo de movimentos sociais em frente a sede do governo do Estado reivindicando moradias, uma vez que o próprio governo ainda não sanou esse problema social, preferindo gastar o dinheiro público em estádios de futebol.          

Equipe da TV chinesa CCTV America no igarapé da Cachoeira Grande

Diante do quadro caótico encontrado por correspondentes da imprensa internacional, não restam dúvidas de que o dinheiro público empregado nos estádios deveria ter um melhor destino, atendendo as necessidades racionais para depois se pensar ao atendido dos pedidos da FIFA. Afinal, o legado que tanto se falou não passou de mera especulação, com gastos desnecessários, enquanto o povo vive nas mais intempéries possíveis sob uma realidade da irresponsabilidade política.   

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Movimentos sociais e membros da academia realizam seminário de saneamento básico


Com o propósito de debater democraticamente com setores da sociedade civil sobre a política de saneamento voltada ao Plano Municipal de Saneamento Básico da cidade Manaus e contribuir na formação de lideranças para o controle social, movimentos sociais, em conjunto com professores da Universidade do Estadual do Amazonas (UEA), Universidade Federal do Amazonas (Ufam)  e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) realizam no dia 4 de junho, na sede da Cáritas, auditório Mãe Paula, o Seminário de Saneamento Básico - a cidade é um direito do cidadão, não um negócio!

Ao contrário do que foi proposto pela prefeitura de Manaus, o seminário, coordenado pelo membro da Cáritas, Marcos Brito abordou todos os quatro componentes do saneamento: fornecimento de água potável, esgotamento de dejetos sanitários, manejo de águas pluviais e manejo de resíduos sólidos.

Na metodologia da apresentação, além da abordagem técnica feitos pelos mestres das universidades e pelo representante do INPA, o seminário contou também com a apresentação de trabalhos sob a visão da sociedade civil, a cargo do Instituto Amazônico da Cidadania - IACi, que abordou o tema esgotamento sanitário e do assessor parlamentar Eduardo Comanetti, com o tema da história do abastecimento de água em Manaus. A composição da mesa também contou com a Sra. Elizabeth Alencar, catadora-membro da Cooperativa de Catadores do Amazonas.

As apresentações técnicas ficaram à cargo do Prof. Dr. Sérgio Bringel, do INPA (abastecimento de água potável e esgotamento sanitário); Prof. Dr. Sergio Dusalvan, do Departamento engenharia Química da UEA (esgotamento sanitário); Prof. Dra. Adorea Rabello, do Departamento de Geografia da Ufam (Manejo das águas pluviais), em conjunto com o médico sanitarista Menabarreto Segadilha, professor aposentado da Ufam; Prof. Dr. Nilson Barreiros, diretor em exercício da Faculdade de Tecnologia da Ufam (manejo de resíduos sólidos). 

Esgotamento sanitário 
O esgotamento sanitário foi um dos pontos polêmicos do seminário revelado ao público presente pelos debatedores. O pesquisador do INPA, Sérgio Bringel revela que há um estratégia do governo do Estado do Amazonas, por via da Secretaria Estadual de Recursos Hídricos e Minerais em aprovar uma legislação que permita que todo o esgotamento da cidade de Manaus seja lançado diretamente no rio Negro. O pesquisador chama atenção que a ideia é um crime ambiental absurdo, mas já está em via de ser aprovado pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos. A proposta do emissário subfluvial para lançamento dos dejetos sanitários no rio Negro foi analisada em um encontro técnico realizado em Manaus, no dia 2 de abril de 2013, no hotel Caesar Business, organizado pelo governo do Amazonas e o banco mundial BID.

No documento intitulado 'Carta de Manaus (Carta Aberta)', revelado pelo pesquisador do INPA e membro do Conselho Estadual de Recursos Hídricos, os técnicos chegaram ao "consenso que é viável a utilização de rios, como o Rio Negro, como corpos receptores de efluentes sanitários, por meio de alternativas de tratamento e lançamento, através de emissário subfluvial, considerando a auto-depuração em corpos hídricos com grande capacidade de diluição". A 'Carta de Manaus' é sustentada pelos professores Dr. Pedro Alem Sobrinho, Dr. Tobias Bernward bleninger, Dra. Mirian Koifman, Dr. Paulo Cesar Moreno, José Almir Rodrigues Pereira, pela ABES Nacional, pelo secretário Daniel Borges Nava, Eng. sanitarista Karina Bueno e especialistas do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) e Conselho Municipal de Meio Ambiente (CONDEMA) e por profissionais de engenharia em saneamento.

Na continuidade da discussão, o prof. Dr. Sérgio Duvalsan lembra que não se pode afirmar quanto ao projeto do emissário subfluvial dará certo ou não, porque não há parâmetro algum sobre o monitoramento da qualidade de água do rio Negro. Afirma que qualquer interferência humana de degradação na natureza poderá gerar sérios impactos negativos e preocupante quanto as consequencias que sofreremos com uma iniciativa com poucas discussões e sem parâmetros técnicos para se chegar a uma avaliação apurada.

A exposição feita pela sociedade civil, por meio do presidente do IACi, Hamilton Leão chama atenção do do problema do esgotamento sanitário no final do século XIX, quando o rio Negro, no ano de 1900 foi colocado como proposta para ser purificador das águas de esgotos que seriam lançadas no rio. Na época, segundo revela o livro "A história do saneamento em Manaus", o projeto desenvolvido estava baseado para uma população em torno de 60 mil habitantes, e que passados 113 anos, mais uma vez o Estado vem apresentar a mesma proposta, mas com um agravante ambiental sério, pois a cidade já não é aquela de 114 anos atrás e agora comporta uma população de quase dois milhões de habitantes.

Como alternativa ao projeto nocivo do Estado, o IACi apresentou e defende uma proposta racional e sustentável com a utilização de biodigestores como captadores dos dejetos sanitários e consequentemente transformá-los em gás de cozinha, biofertilizantes e bioenergia, ao invés de lança-los no rio Negro e nos igarapés de Manaus.

Complementando a apresentação sobre o tema, a Professora Dra. Adorea Rabello traz ao conhecimento do público presente que há um grande equívoco em querer usar o rio Negro como o recebedor dos dejetos sanitários da cidade. Segunda ela, o rio Negro é um rio de foz represado pela sistema fluvial do rio Solimões e um processo de sedimentação em curso, e que a intervenção humana nessa área para o lançamento de toda carga sanitária no rio não é aconselhável por se tratar de uma área de fragilidade ambiental.

Cita também que há grande equívoco na proposta apresentada no texto do Plano de Saneamento Básico de Manaus pela prefeitura, que coloca o rio Amazonas com uma grande disponibilidade hídrica que garante a capacidade de autodepuração das cargas orgânicas, e em seguida apresenta o rio Negro como depositário dos dejetos na proposta do emissário subfluvial.

Menabarreto Segadilha, médico sanitarista faz um alerta para o grande número de doenças transmitidas por veiculação hídrica que estão presentes nas águas do rio negro e nos igarapés de Manaus. Doenças como ameba, esquistossomose, leptospirose, entre outras são tratadas como causas determinantes e virroses, que segundo ele, são desculpas para não se investigar as reais causas das doenças.    

os depoimentos apresentados no seminário servirá de embasamento técnico-jurídico para a Defensoria Pública de Causas Coletivas do Estado do Amazonas propor ação quanto a adequação do tema ao que prevê as leis ambientais e os estudos científicos.