segunda-feira, 22 de maio de 2023

Termo de cooperação do governo do Amazonas com empresa privada concessionária de saneamento destina recursos públicos milionários

 Por Hamilton Leão


O governo do Estado do Amazonas veicula publicidade que irá investir R$ 100 milhões na melhoria da rede de esgoto na cidade de Manaus e a construção de uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) na Alameda Vitória, no bairro Raiz.

O Termo de Cooperação Técnica (TCT), que inclui a prefeitura de Manaus e a empresa concessionária de água e esgoto prevê que esse montante seja aplicado na expansão da cobertura da rede de esgoto sanitário de Manaus em torno de 48 km entre as residências do Programa Social e Ambiental dos igarapés – Prosamim, que compreendem o igarapé do 40 até a comunidade da Sharp, na zona Leste.

O TCT, que não foi publicado pelos canais oficiais do Estado ‘investe’ recursos públicos em empresa privada demandante da concessão pública municipal de serviços de água potável e esgotamento sanitário.

O atual contrato de concessão da PMM com a empresa concessionária em seu sétimo aditivo estabelece a cobertura do serviço da rede de esgoto em 2023 ao patamar de 31%. A mudança se deu baseado em estudos da FGV aceito pela PMM, sustentando os aspectos de caso fortuito ou força maior ocorridos no período da pandemia de Covid-19.

A legislação estadual de 4 de julho de 2000, que rege o contrato de concessão de prestação de serviços públicos de abastecimento de água e de esgotamento sanitário estabeleceu que a concessionária deveria atingir as metas de cobertura e qualidade em 2021 na faixa de 98% para o serviço de água e no ano de 2029 a meta de 90% para o serviço de esgoto.

Essa previsão de 90% para a cobertura do serviço de esgoto, segundo o sétimo aditivo ficou agora para 2033 e se mantém na mesma porcentagem até o ano de 2045, quando termina o contrato da concessionária com a prefeitura de Manaus.

Não obstante, o advento da lei de contrato de concessão proporcionou a venda da Manaus Saneamento, subsidiária pública municipal ligada à antiga Companhia de Saneamento do Amazonas (Cosama) para a iniciativa privada.

O teor dessa torpe história daria para escrever um livro, fazer uma tese de doutoramento ou produzir uma série televisa com vários e vários capítulos, cujo desenrolar já passou por três comissões parlamentares de inquéritos - as CPIs das Águas da Câmara Municipal de Manaus.

Atualmente, a empresa concessionária cobra uma taxa de 100% sobre a tarifa de consumo mensal de água, diante a uma realidade caótica do saneamento, cuja própria prefeitura afirma que há somente 26% de cobertura de esgoto na cidade.

            Apesar de haver instrumentos legais no contrato de concessão, como a intervenção e a encampação para a PMM demandar os serviços de água e esgoto, a administração pública segue a linha de tirar as responsabilidades das empresas concessionárias, postergar as metas propostas, fechar os olhos para os preços públicos cobrados e para a qualidade de saneamento hoje existente.

Por outra via, já vivemos o exemplo de contratos de cooperação de obras voltadas para a empresa concessionária. Voltando ao tempo, podemos constatar a iniciativa do Estado seguindo o hodierno costume do público financiando o privado.

Em 2013, ano de início das operações do Programa Águas de Manaus (Proama), a obra destinada a captar e fornecer água potável às zonas Leste e Norte de Manaus teve um investimento público no valor de R$ 365 milhões, sendo 132,3 milhões contrapartida do governo do Estado do Amazonas e 232,7 milhões obtidos de empréstimo pela Caixa.

Todo esse valor aplicado na obra serviu para acolher uma única empresa privada vencedora da licitação, publicado Diário Oficial n°3837 d 1/3/2016, que se beneficiou por meio de contrato com o poder público de todas as instalações construídas com dinheiro do erário.

Como compromisso de repor os valores do empréstimo, a empresa privada deveria passar os lucros da operação ao Estado, mas segundo o próprio governo, não havia lucro por motivo de inadimplência dos consumidores da zona Leste.

Segundo o que apurou o portal de notícias Amazonas Atual, o ex-diretor do Proama, Sérgio Elias destacou que não havia superávit na operação da empresa Rio Negro Ambiental, a ganhadora da licitação, do grupo da Manaus Ambiental e atribuiu o prejuízo aos consumidores dessa grande região urbana de Manaus, aos quais recebiam a água e não pagavam.

À época, a instalação do Proama na Ponta das Lajes, às margens do rio Negro foi palco de outra polêmica: a destruição arqueológica e ambiental do lugar. Os interesses da obra venceram e os danos nas áreas da paleontologia, arqueologia e ambiental tiveram que amargar sérios prejuízos.

Outro investimento de R$ 44,4 milhões foi empregado pelo governo para construir uma ETE do Prosamim, no bairro Educandos, zona Sul de Manaus e repassada à concessionária de água e esgoto. Desse montante, 11,1 milhões são contrapartida do governo e 33,3 milhões oriundos de empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Essa obra, apesar de já existir uma estrutura construída com estação de captação foi palco de discórdias entre seus vizinhos e a empresa, por causar futuramente, segundo os moradores, danos ambientais com a poluição do ar e das águas em função do recebimento de toda carga de esgoto da zona Sul. A empresa nega os possíveis danos e o governo não moveu nenhum interesse para resolver a situação advertida pelos moradores.   

            Nessa seara, o governo segue investindo dinheiro na empresa concessionária privada e tirando sua responsabilidade de fazer investimento, conforme estabelece o contrato de concessão em vigor desde 2000 em seu art. 13, VII.

Ao todo, $ 509,4 milhões dos cofres públicos já foram destinados a custear as obras do Proama, ETE Educandos e recentemente a de expansão da rede de esgoto da zona Sul, todas de responsabilidades da concessionária de serviços públicos de água e esgoto, sendo que apenas $ 71,8 milhões retornaram ao caixa do governo do Estado.  

No último investimento público de R$ 100 milhões, anunciado há poucos dias, a sociedade deve ficar atenta, pois o processo deve ser acompanhado pela Assembleia Legislativa ou Câmara Legislativa Municipal, conforme prevê o art. 116, § 2° da Lei de Licitações e Contratos com a Administração Pública, n° 8.666, de 21 de junho 1.993.

            Outro alerta trata-se da construção de ETEs em área com grande aglomeração de pessoas, o que pode provocar sérios danos à saúde como poluição do ar e das águas, a exemplo da ETE instalada no bairro Educandos.  Estudos de impacto de vizinhança e relatório de impacto do meio ambiente devem ser solicitados por se tratar de obra de alto risco em espaço urbano habitável.

 

 

 

 

 

 

Instituto Amazônico da Cidadania – IACi

 

Manaus/AM, 22 de maio de 2023

                                                                                                                            

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O IACi é um coletivo socioambiental independente que atua no acompanhamento das funções públicas por meio do irrestrito controle social, como também elabora e executa projetos socioambientais.  


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